Ponto de Vista

 

O anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um homem chamado José, da casa de David; e o nome da virgem era Maria.  Lucas 1:26

A gente diz: isso é seu ponto de vista, para acabar com o diálogo; como se o ponto de vista fosse coisa individual e insólita; impossível de compartilhar ou comunicar.  Além disso, entende-se que necessariamente incorpora preconceitos, ideologias raras e disparates irracionais.  A ideia completa então seria: isso é seu ponto de vista, e você não é ninguém.  Fim de conversa!  Se não há respeito, pois, nem boa vontade; nada há para falar.  Podes ir às compras. Será bem melhor!

                Além disso, os pontos de vista não são fixados em pedra e podem-se partilhar.  A poesia existe precisamente para criar novos pontos de vista.  O mesmo acontece com o cinema, a pintura e a arte em geral.  O leitor se identifica com o poeta; com algum personagem; com alguém fora de si mesmo para olhar o mundo através de novos olhos.  A imagem, seja visual ou verbal, ajuda a ver as coisas que estavam ocultas.  Vive-se, por um momento, a vida de outro.  A música ajuda a sentir os sentimentos de outro.  A arte te faz mais culto porque amplia tua perspectiva.  É algo próprio do ser humano; por isso, toda produção criativa é força humanizante.

                Jesus fez poesia no seu ministério para ajudar o povo a sair de si mesmo e a olhar a mesma realidade a partir de outro ângulo.  Suas poesias são provérbios e parábolas.  Também, curou os cegos, abriu-lhes os olhos para que o povo pudesse ver.

                Existem organizações solidárias que ajudam as pessoas que moram nas ruas.  É gente com dificuldades, gente que não consegue armar sua vida de outro jeito.  A visita semanal dos jovens não transforma essa realidade.  A ajuda concreta não é ambiciosa.  No entanto, é o sinal duma coisa importante e um gesto que diz: não importa quem é você, nem como você vive.  Você é irmão para nós.  Seu ponto de vista, a partir das ruas da cidade, é válido.  Os jovens levam consigo o dever de representar na sociedade esse ponto de vista desconhecido.

                O cristianismo não é um carregamento de doutrinas especializadas.  Não é uma cosmologia exótica nem uma metafísica esotérica com regras estranhas.  Não se trata de informações diferentes dos que outras pessoas pudessem ter. É um jeito de ver o mesmo mundo a partir do ponto de vista dos mais humildes.  O cristão sabe ver de debaixo, e com compaixão.

                Existem pessoas que se acreditam militantemente católicas porque olham ao mundo cheio de erros e sofrimentos com desprezo.  A Santíssima Trindade observa, pois, o mundo de debaixo.  Vê sua criação estragada com feridas, temores e violências, e se comove.  Ao comover-se, a Trindade Santíssima se compromete com a salvação.  Por isso, envia ao anjo Gabriel aos aposentos humildes de Nazaré.

                Há muitos pontos de vista, todos possíveis e alguns muito respeitáveis.  O ponto de vista cristão é, pois, uma opção.  Pela graça do Espírito Santo, opta-se por olhar o mundo como Deus o olha; desde a perspectiva dos humildes, desamparados e esquecidos.  Vendo, o discípulo decide viver em função da salvação dos outros; decide viver a serviço do Deus que resgata os perdidos.

Seu ponto de vista é importante, porque define sua identidade como pessoa. 



Informações:

2 Samuel 7:1-16, Salmo 88, Romanos 16:25-27, Lucas 1:26-38

IV – Domingo do Advento, Ano B.2008.2011.



Pe. Nathan Stone, SJ[i]



[i]  Religioso JESUÍTA, presbítero e missionário na Região Brasil Amazônia.

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